UM BILHETE QUE NUNCA SERÁ LIDO


Eu me lembro bem dessas luzes. Da primeira vez em que andei por essa avenida abarrotada de carros, com buzinas tocando por todos os lados, e aviões voando. Pensava no quanto o futuro, afinal, seria incrível. Nas possibilidades que se abririam ali, nas pessoas que conheceria, nas histórias loucas que eu viveria. A ansiedade tomava conta de mim. Nunca antes fez tanto sentido ficar mais velha no dia da independência.

E é isso que me conforta, sabe? Eu não preciso de você. Eu sei cuidar de mim. Aqui, sozinha, me virando nos 30 quando uma gripe me pega, lavando minhas roupas e secando meus pratos. E vivendo a vida sem você. E curtindo os finais de semana sem você. Te observando sorrir, ao longe, feliz, enquanto finge que nunca me conheceu. Meros desconhecidos.

Mas eu abriria uma exceção. Abriria mão de uma coisa ou outra se eu soubesse que você estaria ali ao meu lado. Eu tentaria algo que nunca fiz antes; bem eu, a moça das asas livres. Mas eu sei que, estando com você, isso não mudaria. Duas liberdades juntas poderiam abrir uma vasta gama de oportunidades fora da nossa gaiola.

É porque eu sinto sua falta. Sinto saudade dos seus olhos, do jeito que me abraçava, das mãos entrelaçadas até o caminho de casa, dos beijos longos, das músicas de fundo que eu aprendi a gostar, dos seus amigos, da sua voz. De você. De estar com você. De assistir filme com você. De saber como as coisas estavam indo, e era tudo tão gostoso, que eu viveria mil vezes seguidas. E de novo. E novamente. E mais uma vez.

Você não deve e nem pode saber, mas eu gosto mesmo de você. E quando faço o mesmo caminho todos os dias, com as luzes, as buzinas e os aviões, sei que posso te ver. E se não puder, o fone de ouvido me ajuda a lembrar dos momentos e faz com que eu me sinta mais perto de tudo.

Porque eu sei que nada vai voltar, e é por isso que às vezes eu queria ter o poder de poder te apagar da memória.

Às vezes quase sempre.

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